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Avaliar ou Mediar?

Chega de fingimentos. Quando um mediador anuncia “avaliações gratuitas”, não está a oferecer um serviço, está a vender uma ilusão. E pior: uma ilusão embrulhada em gráficos coloridos, relatórios com logotipos e linguagem técnica que parecem sérios… mas não passam de folhetos publicitários mascarados.

Não se trata apenas de ética — é a própria lei que o proíbe. A Lei n.º 15/2013, artigo 17.º, é cristalina: empresas de mediação não podem avaliar imóveis que mediam. Ponto final. Quem diz o contrário ou não leu a lei… ou decidiu ignorá-la porque a “avaliação gratuita” dá jeito para captar negócios.

O problema é que esta encenação enganosa gera confiança artificial. O cliente acredita que recebeu uma análise rigorosa e imparcial, quando o que recebeu foi uma peça de marketing. Marketing travestido de parecer técnico. O resultado? Uma fraude elegante, embrulhada em sorriso comercial.

E aqui mora a contradição gritante: o mediador vive da comissão da venda. Logo, nunca é imparcial. Se precisa de captar, pode inflacionar o preço para agradar ao proprietário. Se precisa de fechar, pode baixar para convencer. Avalia com a régua da sua comissão. É juiz e parte — e isso, em qualquer mercado sério, seria considerado um escândalo.

Os danos são reais. Proprietários que acreditam que a casa vale mais do que vale. Compradores enganados por preços sem fundamento. Negócios que implodem na primeira ida ao banco porque a avaliação independente — a que conta para crédito e para decisões de investimento — não bate certo com o “relatório gratuito” do mediador.

Estamos a falar de muito mais do que pequenos detalhes burocráticos. Estamos a falar de corrosão da confiança no mercado imobiliário. De um ambiente onde o “vale tudo” ainda passa por simpatia. Onde se trata a fraude como favor ao cliente.

E tudo isto alimenta um mercado de ficções: valores inflacionados que nunca se concretizam, negociações viciadas que acabam em frustração, desconfiança que mina qualquer sentido de transparência. Se queremos maturidade no setor, temos de expor esta farsa pelo que ela é.

Avaliar é ciência, é método, é responsabilidade civil, é regulação, é normas internacionais. Mediar é vender, negociar, aproximar as partes. Confundir os dois não é “oferecer um serviço completo”: é enganar, é mentir, é desvalorizar quem realmente sabe avaliar.

O mercado não precisa de mais truques simpáticos. Precisa de clareza. E a clareza começa aqui: avaliar não é mediar. E chamar avaliação ao que não passa de publicidade é, simplesmente, uma mentira.